segunda-feira, 5 de agosto de 2013

235

Faz pouco mais de um mês, o meu pai "morreu-me" nos braços.... Entrei lá em casa, ele veio ao meu encontro, eu disse que ía indo para o jantar de anos da Kika, ele disse que a mamã estava a acabar de se arranjar e que já seguiam, levou a mão à cabeça, como quem tem uma tontura e caíu-me nos braços...
Passaram-me mil coisas pela cabeça enquanto o tentava "acordar" em vão, vi que não respirava nem tinha pulso e a partir daí foi um terror. Lembro-me que gritei à minha mãe para ligar às minhas irmãs, lembro-me que pedi para chamar o médico vizinho da frente que não estava em casa, lembro-me que comecei a fazer reanimação, lembro-me que liguei ao 112 enquanto fazia massagem cardíaca, lembro-me que gritava "papá respira, papá respira" vezes sem conta, lembro-me que o meu irmão chegou a voar e alternou comigo a reanimação, lembro-me que chegaram os bombeiros do INEM que nos substituiram e mandaram vir a SIV, lembro-me que chegou a enfermeira e o técnico do INEM que substituiram os bombeiros e chamaram a VMER, lembro-me que foram necessários 10 choques até finalmente ter pulso, lembro-me que chegou o médico do INEM, e o entubou e me tentou, tranquilizar, lembro-me que foram 35 minutos "parado".  lembro-me que foi para a emergência do H Pedro Hispano, o trânsito parado na rua, duas ambulâncias e a a viatura do INEM a bloquearem a passagem, lembro-me que liguei à cardiologista que chegou ao Hospital logo a seguir a nós. Lembro-me que demorou uma eternidade até que saísse da emergência e me dissesse: "o teu pai é duma fibra! Já acordou e reconheceu-me.... Parece-me que não em défices, mexe bem os membros e já quer falar!" Lembro-me de me ter agarrado a ela e finalmente ter chorado. Lembro-me de pedir para o ver e de ficar ali a olhar para ele a sorrir. Lembro-me do médico do INEM ter voltado para "ver com os próprios ollhos o milagre" que lhe tinham contado. Lembro-me que a seguir foi para os cuidados intensivos do H S. João onde ficou 3 semanas, lembro-me que no lugar do pace-maker tem agora um cardio desfibrilhador. 
Lembro-me que voltou para casa numa sexta-feira. Lembro-me que não consigo sair de perto dele, que não consigo dormir sossegada, que me parece ouvir a minha mãe chamar-me de noite a toda a hora. Lembro-me que desmarquei as férias longe de casa. 

Lembro-me que parei de viver, que estou no limbo, e que tem sido muito difícil regressar ao que era antes....



quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

234

Há uns dezoito anos atrás, ainda trabalhava no Porto no Hospital de Santo António, bateram no meu carro por trás quando parei num stop. Quando saí do carro deparei-me com um rapazinho muito novo, que estava a pegar em bocadinhos de vidro do farol partido lavado em lágrimas e a murmurar: "a minha mãe vai-me matar, a minha mãe vai-me matar....." Não consegui resistir àquele quadro e depois de avaliar os poucos danos do meu carro, mandei-o embora. Ele ainda insistiu que a culpa era dele, mas eu não mudei de opinião. Achei que já estava arrependido que chegasse e disse-lhe apenas que esperava que tivesse aprendido a lição e passasse a conduzir com mais cautela.

Hoje relembrei este incidente quando o meu filho telefonou em pânico a contar que tinha sido "apanhado" pela polícia a calcar um traço contínuo, sem cinto de segurança, a lançar um cigarro apagado pela janela, sem documentos do carro e sem o impresso do seguro (sim, que vergonha, isto tudo junto.... só faltou ir agarrado ao telemóvel :)
Pelo vistos conquistou da mesma forma o coração do agente que o mandou para casa com muitas recomendações de mais juízo e apenas com 50 euros de multa por conduzir sem cinto.....
Claro que me vai ouvir o fim de semana todo, que eu não vou deixar passar isto em branco...e vai ficar de castigo até casar :) E aquela história de que se educa pelo exemplo não me parece ter dado frutos!

(mas que  às vezes as recompensas tardam, mas chegam é bem verdade :)


domingo, 27 de janeiro de 2013

233


Vai fazer um ano que um casal de grandes amigos nos "deixou" as filhas em testamento. De entre todos os muitos amigos e familiares que têm, escolheram-me a mim, ao meu marido e aos meus filhos, para sermos a famíla das filhas se algo de muito mau lhes acontecer na vida. Quando nos pediram para o fazermos disseram que estavam conscientes da enorme responsabilidade que nos passariam, mas que não encontraram família melhor para as meninas crescerem sem eles, mesmo sabendo do meu estado de saúde. Os meus filhos estão quase criados (têm 20 e 16 anos), elas ainda são pequeninas, têm 6 e 2 anos e aceitar este pedido foi uma decisão de família, pensada a quatro.
Claro que não estamos a pensar que vá acontecer alguma coisa aos nossos amigos. Mas eles vivem num país difícil onde os carros são blindados, onde se anda de guarda costas, onde há recolher obrigatório e não se pode nunca jantar fora sem correr riscos, por isso salvaguardaram o futuro das filhas.

(Temos saudades vossas, queridos que amigos vivem longe.....)